O impacto das mudanças climáticas no setor elétrico foi debatido em evento virtual promovido pela Climatempo
O Brasil está enfrentando uma crise hídrica só antes vista em 1950, o planejamento energético não está preparado para a seca.
O coordenador do Grupo de Estudos e Pesquisas em Mudanças Climáticas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e membro do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), o cientista José A. Marengo, diz que “não é só culpa da gestão: também há, de fato, menos água caindo”.
“As pessoas acham que a mudança climática é um problema do futuro, mas na verdade já está acontecendo”, completa Marengo.
Luiz Barroso, presidente da consultoria internacional PSR, acredita que a seca deste ano possa ser atribuída à mudança climática.
A mudança climática é o fator de maior risco para a indústria global de energia. Eventos de mudança climática estão se tornando mais frequentes no Brasil e no mundo. Os grandes desafios do planejamento energético envolvem se adaptar a esses fenômenos e lutar contra os efeitos comerciais.
Até ser encontrada uma solução estrutural, as alternativas para a sociedade devem ser armazenar e produzir a própria energia e reduzir o consumo.
Apesar do Brasil concentrar 12% da reserva de água do planeta, a falta de regularidade hidrológica tem sido pauta frequente no país, em especial a partir dos anos 2000.
O planejamento energético brasileiro usa dados e métodos probabilísticos que não demonstram adequadamente os desafios atuais e futuros, o que piora o cenário de probabilidades não muito conhecidas, visto que o clima está em transformação.
Segundo Luiz Barroso, que já foi presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), órgão de planejamento do Ministério de Minas e Energia (MME), “mesmo que o planejamento faça tudo certinho, existe ainda uma dificuldade muito grande de implementação, pois essas decisões têm efeitos comerciais”.
No dia 20 de setembro, foi realizado um debate virtual promovido pela Climatempo no qual as mudanças climáticas e o impacto no setor elétrico foram temas.
O executivo Carlos Augusto L. Brandão, presidente da Associação Brasileira de Armazenamento e Qualidade de Energia (Abaque), foi um dos interventores do setor elétrico durante o racionamento de energia no país em 2001.
Durante esses 20 anos, o país passou por outras crises de fornecimento de energia, e a solução encontrada sempre foi a mesma: despachar usinas termelétricas fósseis. O que traz como consequência efeitos negativos à população e a toda a economia, pois gera um aumento das tarifas de energia elétrica.
“O grande problema nosso chama-se água. A chuva não cai mais onde caía e isso é fato. A degradação do solo mudou todo o fluxo das águas para as canaletas dos rios, o que do ponto de vista de energia assegurada traz um dimensionamento errático e errado daquilo que é a disponibilidade de energia que temos”, afirma Brandão.
“Algumas simulações que fizemos aqui apontam que serão necessários surtos de 7 a 10 GW por 2 ou 3 anos, dependendo da forma que a gente privilegiar o consumo, para que a gente consiga recolocar essa água a nível de reservatórios. É um desafio muito grande”, avisa o executivo.
Para Brandão, esse é o momento do país se adiantar do ponto de vista de planejamento energético, eliminar barreiras regulatórias, comerciais e políticas que prejudicam o avanço de tecnologias novas, como meios de armazenamento de energia, hidrogênio e geração descentralizada.
“O assunto energia tem que se resolver dentro de outro formado comercial e regulatório. Atacar pelo modelo velho, tanto comercial quanto regulatório, significa postergar decisões estratégicas para essa nação pelos próximos 30 anos”, explica.
O setor elétrico responde a 27% das emissões mundiais de carbono, a procura por uma economia de baixo carbono encaminhará um volume grande de empreendimentos para tecnologias limpas e renováveis, apesar de todas as formas de se obter energia serem necessárias para atender às necessidades de uma economia que se encontra cada vez mais eletrointensiva.
Elbia Gannoum, vice-presidente do Conselho Global de Energia Eólica (GWEC, na sigla em inglês) e presidente-executiva da Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica), acredita que a transição energética deve ser inclusiva e justa, tornando possível que países menos desenvolvidos avancem sem prejudicar o clima.
“A busca pela eletrificação da matriz parece ser um caminho mais adequado e essa eletricidade pode ser provida com energias renováveis. Entendo que o Brasil tem um papel de protagonista nesse processo pelo fato de ter muitas fontes renováveis”, assegura Gannoum.
O presidente da PSR, Luiz Barroso, acredita que a energia solar é o futuro da indústria de energia no mundo.
Apesar dos choques causados pela pandemia da Covid-19 no mundo inteiro, como valorização do dólar, frete marítimo em alta e escassez de materiais, como o silício, a geração solar distribuída está em expansão acelerada no Brasil. Os ganhos em escala e a inovação tecnológica estão reduzindo o preço da geração, e os consumidores estão percebendo o valor da tecnologia no mundo inteiro, inclusive no Brasil.
“Acredito no crescimento forte da geração colocada do lado do consumidor, até depois da percepção que a sociedade vai ter da crise hídrica”, crê Barroso.
“A defesa que a sociedade tem em relação à crise hídrica é produzir a sua própria energia, quem sabe também armazenar e até mesmo produzir um excedente para uma venda à distribuidora”, acrescenta o executivo.
Para Brandão, a discussão sobre a qualidade de energia propicia soluções, como o armazenamento de energia por baterias e a geração distribuída. “A resiliência desse sistema e a qualidade para vários consumidores já está sendo ponto de venda de solar com armazenamento de energia.” “A solar com bateria será imbatível a longo prazo no Brasil”, conclui.
Fonte: https://www.portalsolar.com.br/blog-solar/energia-solar-nas-cidades/produzir-a-propria-energia-pode-ser-a-defesa-da-sociedade-em-relacao-a-crise-hidrica.html